Entre
as principais atrizes-cantoras do começo do século XX, destacamos a carioca
JÚLIA MARTINS. Ela foi uma das primeiras atrizes negras a se profissionalizar
em nossos palcos, na virada do século XIX para o XX, destacando-se também nas
gravações em discos.
Há
92 anos essa notável artista falecia.
Conheçam
um pouco de sua trajetória.
Júlia
Martins nasceu no Rio de Janeiro em 20 de abril de 1886 (algumas fontes dão
como 1890). Adotamos o ano de 1886, devido a notas nos jornais de 1897, que afirmavam
que ela teria onze anos de idade.
Em
24 de agosto de 1897, o jornal O Paiz anunciava a primeira representação da
tradicional ópera-cômica O Sinos de Corneville, no Theatro Eden
Lavradio, com um elenco formado por crianças, pela Companhia Infantil da
Empresa Palmerino Martins & C., com direção cênica do célebre Jacinto
Heller e tendo Agostinho Gouvêa como regente e ensaiador.
A
famosa ópera-cômica era uma tradução de Eduardo Garrido, com música de Robert
Planquette. O elenco, todo com crianças entre nove e quatorze anos de idade,
trazia Júlia Martins, então com onze anos, interpretando Martha, ao lado de
também futuros artistas de destaque, como Asdrúbal Miranda (14 anos), que vivia
Nicoláo, o pescador, e o “inteligente menino” Franklin de Almeida (14 anos),
vivendo Gaston de Corneville. Em 05 de outubro de 1897, a peça era levada ao
Theatro Municipal (seria em Niterói? Uma vez que o conhecido Theatro Municipal
do Rio de Janeiro foi inaugurado em 1909. Peço ajuda ao colegas
pesquisadores.).
Em
30 de julho de 1898, no Theatro Sant´Anna, no Rio de Janeiro, Júlia Martins
estreava na revista madrileña A Gran-Via, tradução de Moreira Sampaio e música
dos maestros Chueca e Valverde. Ela interpretava o papel de “Criada de servir”,
sendo apresentada pelo Jornal do Commercio como a “apreciada e gentil
actrizinha” Júlia Martins. A empresa era a de Ferreira de Souza e o elenco,
também formado por crianças.
Em
28 de janeiro de 1899, Júlia Martins embarcava no navio Pernambuco para a
cidade de Vitória (ES) e também em direção aos “Estados do norte”, indo com a
companhia do empresário Umbelino Dias, que tinha como diretor o ator Cardoso da
Motta. Ao lado de Júlia Martins, outros artistas infantis, como Carmen Roldan,
Maria Roldan, Consuelo Ulhes, Asdrúbal Miranda e Franklin de Almeida.
Essas
companhias infantis exibiam as famosas peças de operetas e revistas que eram
apresentadas por atores adultos. Dessa forma, Júlia Martins estreou no mundo
artístico, como atriz-cantora infantil. Ao longo dos anos, iria se destacar
como cançonetista.
Em
13 de dezembro de 1902, o jornal A Capital anunciava Júlia Martins, ao lado do
ator Lino, apresentando-se no Parque Rio Branco, em Niterói. Nesse local, ao
lado dela, também se apresentavam Anna Manarezzi, Eduardo das Neves e Geraldo
Magalhães. Em 20 de janeiro de 1903, o mesmo jornal anunciava para esse mesmo
teatro, “Júlia Martins, saleroza e cheia de graça promette mil cousas para esta
noite”.
Ainda
em 1902, também atuou na cidade de Petrópolis.
Em
28 de dezembro de 1903, Júlia Martins estreava no Theatro Maison Moderne, como
cançonetista brasileira.
Em
1897, o empresário tcheco Frederico (Fred) Figner iniciou as gravações em
cilindros no Brasil, convidando os artistas Bahiano (Manuel Pedro dos Santos) e
Cadete (Manuel Evêncio da Costa Moreira) para fazerem as primeiras gravações. A
partir de 1902, na Casa Edison, da autoria de Fred Figner, eram gravados os
primeiros discos no Brasil, com a participação de Bahiano e Cadete. Os
cilindros ainda circularam por vários anos e, em 1903, no jornal O Echo
Phonographico, encontramos um anúncio de cilindros brasileiros: “Continuamos
tambem a imprimir Cançonetas e Modinhas Brasileiras de Sta. Consuelo, Júlia e
do celebre Bahiano”. Senhorita Consuelo foi uma das primeiras mulheres a gravar
disco no Brasil e, pela nota, também gravou cilindros. Já a cantora Júlia,
citada no anúncio, seria Júlia Martins? A julgar pela notoriedade da artista
como cantora, é provável que sim.
A
partir de 1907, segundo o site da Discografia Brasileira, Júlia Martins começou
a ter seus discos lançados no mercado. Até 1914, gravaria cerca de 32 músicas,
algumas em parcerias com cantores como Eduardo das Neves, João Barros e
Bahiano.
Com
Bahiano, ela deixou célebres registros como Cidade Nova e Saco do Alferes,
que fazia parte da peça O Rio Nú, do final do século XIX, com melodia do
tango Favorito, de Ernesto Nazareth. Júlia e Bahiano tinham uma ótima
sintonia e sempre estavam bem à vontade nas gravações, brincando um com outro.
Podemos sentir isso ouvindo Ai, que gostos, O Engraxate e O
Vagabundo e a Mulata, A Vassourinha. Também sabiam ser românticos em A Cigana e o
Feiticeiro e, principalmente, em O Retrato e a Flor.
Com
João Barros, ela gravou algumas músicas, entre as quais destacamos A Capital
Federal, tango da burleta homônima de Arthur Azevedo, no qual eles
interpretam, precisamente, o Tango do Lourenço, o cocheiro da peça, que
canta com a protagonista, a cortesã Lola. Júlia Martins, em meados da
década de 1910, atuara em uma remontagem de A Capital Federal, vivendo a
criada Benvinda.
Sozinha,
Júlia Martins gravaria A Mulatinha, de Chiquinha Gonzaga. Também
gravaria, entre outras, A Flor da Pitangueira, modinha que ela cantou na
peça República do Amor, em 1913. Também gravaria o sucesso do Carnaval
de 1913, Caraboo, de Sam Marshall e Alfredo Albuquerque.
Júlia Martins O Imparcial, 12 de junho de 1915, p.06 http://memoria.bn.br/ |
Em
grupo, Júlia Martins participou de duas antológicas gravações: Cabocla de
Caxangá, que ela viveu no teatro de revista; e A Viola está magoada. A
primeira, gravada por Eduardo das Neves, com Bahiano e Júlia no coro; e a
segunda, gravada por Bahiano, com Júlia no coro.
No
começo da década de 1910, passou a se dedicar mais ao teatro musicado, atuando
em várias companhias teatrais e alcançando sucesso nos palcos, sendo uma das
primeiras atrizes negras a se profissionalizar nesse gênero teatral.
No
gênero revista ou burleta, Júlia Martins se destacou em várias peças, como O
Reino do Maxixe, A Capital Federal, Cabocla de Caxangá, A
Sertaneja, Morro da Favela, Flor de Catumby, O Pé de Anjo,
entre outras.
Júlia Martins e Brandão Sobrinho em A Capital Federal, 1915 Ela interpretou Benvinda e ele, Seu Figueiredo Jornal de Theatro & Sport, 1915 http://memoria.bn.br/ |
O Imparcial, 22 de dezembro de 1915, p.12 http://memoria.bn.br/ |
Júlia Martins faleceu em 13 de outubro de 1932, à noite, vitimada por um ataque cardíaco, em sua casa, na Rua do Lavradio, nº 70, no Rio de Janeiro. Ela tinha 46 anos.
Júlia Martins Comédia, 1918 http://memoria.bn.br/ |
RECORTES SOBRE JÚLIA MARTINS
A Capital, 03 de janeiro de 1903 http://memoria.bn.br/ |
A Capital, 11 de janeiro de 1903 http://memoria.bn.br/ |
A Notícia, 13 e 14 de janeiro de 1905, p.01 http://memoria.bn.br/ |
A Capital, 22 de junho de 1909, p.01 |
A Capital, 24 de junho de 1909, p.01 http://memoria.bn.br/ |
Jornal de Theatro & Sport, 1915 http://memoria.bn.br/ |
O Imparcial, 28 de outubro de 1915, p.12 http://memoria.bn.br/ |
Júlia Martins Futuro das Moças 1917, p.16 http://memoria.bn.br/ |
Comédia, 1918 http://memoria.bn.br/ |
Jornal de Theatro & Sport, 1919 http://memoria.bn.br/ |
Comédia, 1919 http://memoria.bn.br/ |
Comédia, 1919 http://memoria.bn.br/ |
Comédia, 1919 http://memoria.bn.br/ |
Diário da Noite, 14 de outubro de 1932, p.05 http://memoria.bn.br/ |
Jornal do Brasil, 14 de outubro de 1932, p15 http://memoria.bn.br/ |
A Noite, 18 de outubro de 1932, p.12 http://memoria.bn.br/ |
A Batalha, 18 de outubro de 1932, p.04 http://memoria.bn.br/ |
GRAVAÇÕES DE JÚLIA MARTINS
A
CAPITAL FEDERAL
Tango
de Arthur Azevedo e Nicolino Milano
Gravado
por Júlia Martins e João Barros
Acompanhamento
de Orquestra
Disco
Victor Record 98.908
Gravado
e lançado em 1907
A
VASSOURINHA
Dueto
de Felipe Duarte e Luiz Filgueira
Gravado
por Bahiano e Júlia Martins
Acompanhamento
de Piano
Disco
Odeon Record 120.375
Gravado
em 09 de dezembro de 1912 e lançado em 1913
O
ENGRAXATE
Dueto
de B. Esfolado
Gravado
por Bahiano e Júlia Martins
Acompanhamento
de Piano
Disco
Odeon Record 120.376
Gravado
em 09 de dezembro de 1912 e lançado em abril de 1913
O RETRATO E A
FLOR
Arquivo Nirez |
Dueto
Gravado por Bahiano
e Júlia Martins
Acompanhamento
de Piano
Disco Odeon
Record 120.436
Gravado em 17 de
dezembro de 1912 e lançado em 1913
CIDADE
NOVA E SACO DO ALFERES
Dueto
de Bahiano e Ernesto Nazareth
Gravado
por Bahiano e Júlia Martins
Acompanhamento
de Piano
Disco
Odeon Record 120.438
Gravado
em 17 de dezembro de 1912 e lançado em 1913
AI
QUE GOSTOS!
Dueto
de Bahiano
Gravado
por Bahiano e Júlia Martins
Acompanhamento
de Piano
Disco
Odeon Record 120.439
Gravado
em 17 de dezembro de 1912 e lançado em 1913
O
VAGABUNDO E A MULATA
Dueto
de Bahiano
Gravado
por Bahiano e Júlia Martins
Acompanhamento
de Piano
Disco
Odeon Record 120.440
Gravado
em 17 de dezembro de 1912 e lançado em 1913
A
CIGANA E O FEITICEIRO
Dueto
de Eustórgio Wanderley
Gravado
por Bahiano e Júlia Martins
Acompanhamento
de Piano
Disco
Odeon Record 120.441
Gravado
em 17 de dezembro de 1912 e lançado em 1913
A
VIOLA ESTÁ MAGOADA
Samba
de Catullo da Paixão Cearense
Gravado
por Bahiano e Júlia Martins
Acompanhamento
do Grupo da Casa Edison
Disco
Odeon Record 120.445
Gravado
em 18 de dezembro de 1912 e lançado em 1913
CABOCLA
DE CAXANGÁ
Batuque
Sertanejo de João Pernambuco e Catullo da Paixão Cearense
Gravado
por Eduardo das Neves, Bahiano e Júlia Martins
Acompanhamento
do Grupo da Casa Edison
Disco
Odeon Record 120.521
Gravado
em 02 de janeiro de 1913 e lançado em 1913
CARABOO
Canção de Sam Marshall
e Alfredo Albuquerque (P. Dante)
Gravada por
Júlia Martins
Acompanhamento
de Orquestra
Disco Odeon
Record 137.063
Gravado
em 16 de abril de 1913 e lançado em 1913
A
FLOR DA PITANGUEIRA
Lundu
de Luz Jr.
Gravado
por Júlia Martins
Acompanhamento
de Orquestra
Disco
Odeon Record 137.064
Gravado
em 16 de abril de 1913 e lançado em 1913
Agradecimento ao Arquivo Nirez
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