Nossa música é conhecida por ter, em sua história, brilhantes compositores, muitos de talento excepcional. Ao pesquisar sobre os primórdios de nossa música popular é impossível não fazermos as perguntas: Quem eram as compositoras? Onde elas estavam ao longo de toda essa história?
Essas inquietantes perguntas esbarram na realidade da vida em sociedade do começo do século XX e século XIX, período de nossas pesquisas. Nessa época, a mulher era educada para ser esposa, mãe, cuidar do lar e de sua família. Não havia outras opções aceitáveis pela, então, chamada “boa sociedade”. A moça que fosse contra a esse sistema patriarcal de poder sofreria sérias repressões. Um bom exemplo disso é a vida da compositora e maestra Chiquinha Gonzaga que, enfrentando a sociedade da época para seguir seu trabalho como compositora, sofreu vários golpes e perdas pessoais.
Como Chiquinha Gonzaga, outras mulheres também ousavam ir contra essas regras sociais. Atrizes, cantoras e compositoras seguiam seus talentos artísticos, mesmo pagando um (alto) preço pela “ousadia”. Com uma pesquisa minuciosa podemos perceber que várias mulheres se lançaram no meio artístico como compositoras, todas também pianistas e/ou cantoras.
Através dos anos e décadas, o ranço machista de nossa sociedade abafou o talento e a visibilidade dessas artistas. Se dizermos um levantamento de meados do século XIX até meados do século XX, veremos que em cem anos o número de compositoras é muito expressivo, porém, o número de compositores é esmagadoramente maior. Pudera, os homens eram incentivados a publicarem suas composições, o mesmo não sendo muito alentado entre as mulheres.
Na presente postagem trago trinta compositoras cujas obras datam de 1868 até 1958. Nesses noventa anos, podemos conhecer várias artistas que se dedicavam à música não só como compositoras, mas também como atrizes e/ou cantoras e que não tinham medo de expor seus versos ou melodias ao público.
Muitas ficaram de fora da lista, o que nos prova que o número de compositoras é muito maios do que imaginamos.
À
elas, nossa singela homenagem.
CHIQUINHA GONZAGA O Malho, 1935 http://memoria.bn.br/ |
Francisca
Gonzaga, ou Chiquinha Gonzaga, nasceu no Rio de Janeiro em 17 de outubro de
1847. Foi uma de nossas primeiras compositoras a se destacar na música popular
do Brasil, sendo também uma de nossas primeiras maestras e compositoras de
peças teatrais. Com seu talento e pioneirismo deixou centenas de composições,
muitas delas clássicos de nossa música, como a marcha Oh, Abre Alas, Corta
Jaca (Gaúcho), Lua Branca, Côrte na Roça, Plangente,
entre tantas outras. Chiquinha Gonzaga compôs desde os 11 anos de idade (em 1868) até os
87 anos, quando faleceu, em 28 de fevereiro de 1935.
Partitura de Atraente http://bndigital.bn.gov.br/ |
ATRAENTE
Selo de Atraente https://discografiabrasileira.com.br/ |
Polca de Chiquinha Gonzaga
Serafina
Augusta Mourão do Vale, mais conhecida por Viúva Guerreiro, foi uma pianista e
compositora brasileira. Passou a editar e publicar suas músicas após a morte do
primeiro marido, em 1900. Eles eram donos da loja Ao Piano de Cristal, que
vendia pianos, músicas e água mineral Vichy. Em 1902, casou-se com Augusto
Guerreiro Lima, assinando Serafina Augusta do Vale Guerreiro Lima. Seguiu
administrando Ao Piano de Cristal e, após a morte de seu segundo marido, entre
1909 e 1910, ficou conhecida como Viúva Guerreiro, nome que deu ao seu
estabelecimento comercial.
Sua mais
célebre composição foi a valsa Penso em Ti, compósita em 1915. Em homenagem
ao político Ruy Barbosa, escreveu a valsa Supremo Mestre, a que Barbosa
lhe agradeceu pessoalmente. Essa valsa seria gravada por Mário de Azevedo na
década de 1940, que também gravaria a valsa Quando Penso em Ti, da mesma
autora.
A Rua, 29 de janeiro de 1918, p.04 http://memoria.bn.br/ |
SUPREMO MESTRE
CINIRA POLONIO Fon Fon, 1912 http://memoria.bn.br/ |
Cinira
Polonio nasceu no Rio de Janeiro. Foi contemporânea de Chiquinha Gonzaga e,
mesmo lembrada como atriz e empresária de sucesso, Cinira foi também
compositora. Como atriz, ela se tornaria célebre e referência de atuação e
elegância no Brasil e na Europa na virada do século XIX para o século XX e,
como empresária, seria a responsável por implantar em nosso país os espetáculos
por sessões. Já como compositora, embora (ainda) não tenha tido sua obra
gravada, Cinira Polonio deixou peças como Sous Mon Regard Soommeille e Souvenir
du Bresil.
Sous Mon Regard Soommeille Arquivo Marcelo Bonavides |
Souvenir du Bresil Arquivo Marcelo Bonavides |
Hilda M. de Mattos foi uma compositora de Fortaleza, Ceará. Ao longo da década de 1920, compôs e publicou algumas peças como Trianon, Beijos em Excesso e Pequei em te Beijar. Essas duas últimas seriam gravadas em discos Odeon Record (gravações mecânicas), em 1927, por um cantor que estava conquistando cada vez mais o sucesso nacional, Francisco Alves. No selo do disco Pequei em te Beijar, a autora inverteu seu nome, assinando Adlih Sattam.
A Esquerda, Fortaleza 18 de abril de 1928, p.03 http://memoria.bn.br/ |
Selo de Beijos em Excesso Arquivo Nirez |
Selo de Pequei em Te Beijar Arquivo Nirez |
ZIZINHA
BESSA
ZIZINHA BESSA Diário Carioca, 02 de setembro de 1930, p.03 http://memoria.bn.br/ |
Zizinha Bessa foi uma cantora, pianista e compositora brasileira, tendo se destacado na segunda metade da década de 1920. Teve duas composições gravadas pela cantora Jesy Barbosa, Medroso de Amor, samba canção que fez parte do primeiro disco de Jesy; e Coração, Fecha os Ouvidos, canção em parceria com Oswaldo Orico, lançada em 1931.
CELESTE
LEAL BORGES
CELESTE LEAL BORGES Diário Carioca, 02 de setembro de 1930, p.03 http://memoria.bn.br/ |
Celeste Leal Borges foi uma pesquisadora de nosso folclore, cantora e compositora. No final da década de 1920 e início da década de 1930, Celeste gravou alguns discos, algumas músicas de sua autoria. Segundo uma parente sua, ela era uma mulher corajosa que participou da Revolução Paulista de 1932, sendo também exilada política.
ZELITA
VILLAR E RÉA CIBELE
Zelita Villar e Réa Cibele compuseram algumas músicas que foram gravadas por Jesy Barbosa e Francisco Alves. A composição da dupla Canção do Barqueiro, gravada em 1933 pelo Rei da Voz, recebeu Menção Honrosa em um concurso promovido pelo jornal A Noite, em junho de 1933. Outro destaque da dupla é o samba canção Saudade de uma Saudade, belo samba canção gravado por Jesy Barbosa em 1932.
A pernambucana Stefana de Macedo foi uma das pioneiras cantoras/pesquisadoras de nosso folclore, iniciando sua carreira artística na década de 1920. Também era violonista, professora de violão e compositora, além de fazer arranjo em algumas peças populares.
Amélia Brandão Nery é mais conhecida hoje como Tia Amélia, a excelente e carismática pianista que, com idade avançada, fazia a alegria das pessoas ao se apresentar na TV e em espetáculos. Porém, essa pernambucana de grande talento se destacou na década de 1920 como pianista e compositora inspirada. Indo ao Rio de Janeiro em 1930, foi homenageada por Ernesto Nazareth e teve várias composições gravadas por conterrâneos seus, a exemplo de Stefana de Macedo, Vicente Cunha e sua filha, Silene Brandão Nery, bem como outros nomes de nossa música popular.
Maria Eugênia Celso Carneiro de Mendonça, ou Maria Eugênia Celso, era uma famosa poetisa. Encontramos citações sobre ela em periódicos, desde a década de 1910. Na década de 1930 ainda estava atuando, tendo composto com Stefana de Macedo, Meu Home, que Stefana lançou em disco Columbia em 1930.
Gilka da Costa de Melo Machado foi uma importante poetisa brasileira. Foi uma das primeiras mulheres a escrever poesia erótica no Brasil, também sendo uma das fundadoras do Partido Republicano Feminino (1910), defendendo o voto feminino, onde foi tesoureira. Sua filha, Eros Volúsia, foi uma famosa atriz e bailarina, com fama internacional. Seu poema Encantamento foi musicado pelo cantor Francisco Alves, que o gravou na Odeon em 1938.
Laura Suarez surgiu no cenário artístico em 1929 ao ser eleita Miss Ipanema. Muito bonita, Laura também tinha vários talentos, tendo uma bela voz e o dom para compor. Lançou-se como cantora e compositora no final de 1929, com sucesso. Gravou vários discos, interpretando suas composições ou de outros colegas. Fez músicas sozinha ou em parceria com o maestro e compositor Henrique Vogeler. Laura Suarez apareceria na primeira transmissão de televisão no mundo, na primeira metade da década de 1930.
Gilda de Abreu foi uma cantora e atriz franco-brasileira de muito sucesso nas décadas de 1930 a 1950. Artista de muitos talentos, foi uma de nossas cineastas pioneiras, dirigindo o esposo, o cantor Vicente Celestino, no filme O Ébrio (1946). Gilda e Vicente atuariam juntos em operetas que ficariam na memória do público como A Canção Brasileira, de 1933. Entre as composições de sua autoria está a valsa Bonequinha de Seda, em parceria com Narbal Fontel, do filme homônimo estrelado por Gilda de Abreu em 1936.
Valentina
Biosca era um nome conhecido no meio do rádio da década de 1930. Compositora,
escrevia letras e, segundo a revista O Malho de 1934, escondia seu nome em
algumas composições. Ao que parece também trabalhava na gravadora Victor. Entre
suas composições conhecidas estão Comigo Não, samba gravado por Carmen
Miranda em 1934, e Torturas de Amor, valsa gravada por Januário de
Oliveira, ambas em parceria com Heitor Catumby.
Ivani
Ribeiro é lembrada e respeitada até hoje como uma bem-sucedida autora de
telenovelas, com destaque para Mulheres de Areia e A Viagem,
sucessos que encantaram e encantam gerações. Ela havia sido autora de
radionovelas e também compositora, atuando desde a década de 1930. Entre essas
composições, destaco A Vida é um Samba, samba feito em parceria com a
cantora Sônia Carvalho, que o gravou em 1937 na Columbia.
Compositora precoce, editou aos nove anos de idade sua primeira composição, o tanguinho Quantas Vezes. Teve suas composições gravadas desde o final da década de 1920 por nomes como Gastão Formenti e Laís Marival. Lina Pesce ganhou, em 1938, ganhou o primeiro lugar em um concurso de músicas carnavalescas com a marcha Você Gosta de Brincar, que Laís Marival gravou.
Carolina Cardoso de Menezes foi uma
de nossas grandes pianistas sendo também uma inspirada compositora. Atuou como
pianista em várias rádios, acompanhando em gravações de discos alguns de nossos
intérpretes, como Almirante no samba Na Pavuna, de Almirante e Homero
Dornelas, em gravação de 1930. Destaco em sua obra o fox blue Preludiando
e o choro Novidade.
Sônia
Carvalho foi uma das grandes cantoras paulistanas da década de 1930, tendo
feito sucesso também no Rio de Janeiro. Foi uma das cantoras que inaugurou a
Rádio Nacional do Rio de Janeiro, em 1936. Sônia Carvalho também compôs, tendo
gravado duas de suas composições, Té Logo, marcha, e A Vida é um
Samba, samba em parceria com Ivani Ribeiro.
Otília
Amorim foi uma das mais queridas atrizes do Teatro de Revista, fazendo muito
sucesso desde a década de 1910 até meados da década de 1940. Era desenvolta no
palco, sendo uma das precursoras do samba nos teatros. Lançou vários sucessos ao
longo de sua carreira e gravou alguns discos. Entre as músicas que gravou está
uma de sua autoria, o samba Sem Você, que ela compôs em parceria com Otávio
França.
Aracy
Côrtes é tida como uma das mais famosas Rainhas do Teatro de Revista. Seu
reinado nos palcos durou do começo da década de 1920 até o final da década de
1940, voltando vez ou outra para a alegria dos fãs. Foi uma cantora de voz
bonita e poderosa, lançado vários compositores e clássicos de nossa música.
Segundo ela, havia composto uma letra para o choro Carinhoso, de seu amigo de
infância Pixinguinha, que teria feito sucesso nos teatros, mas não chegou a ser
gravada. De sua autoria, que ela mesmo gravou em 1953, foi o samba Denguinho,
em parceria com César Cruz.
Carmen
Miranda foi a cantora de mais prestígio e projeção de nossa música popular
durante a década de 1930. Foi também a que mais gravou nesse período, lançado
uma nova forma de interpretar sambas e marchas que influenciaria várias outras
jovens cantoras. Mesmo sendo uma intérprete consagrada, Carmen Miranda compôs
duas músicas, o samba Os Home Implica Comigo, em parceria com
Pixinguinha, e a marchinha Por Ti Estou Presa, em parceria com seu
padrinho artístico Josué de Barros.
Linda
Batista foi a rainha absoluta do rádio, sendo eleita onze vezes consecutivas.
Grande estrela de nossa música popular durante o final da década de 1930 e ao
longo das décadas de 1940 e 1950, Linda Batista lançou vários sucessos e
conquistou uma grande legião de fãs. Compôs algumas músicas, que seriam
gravadas por ela ou por sua irmã Dircinha Batista e outros nomes de nossa
música.
MYRIAM ROCHA
MYRIAM ROCHA http://memoria.bn.br/ |
Em 1935,
a revista O Malho publicava o retrato e uma nota sobre a compositora Myriam
Rocha, afirmando que as mulheres compositoras no Brasil eram raras, sendo
raríssimas as que compunham boa músicas. Seria verdade? Myriam Rocha estava
entre as boas compositoras, porém, fico pensando em quantas outras compositoras
igualmente talentosas não estavam pelo Brasil produzindo e tentando mostrar
suas obras. Myriam Rocha teve duas músicas gravadas por Paulo Murilo,
Sentimento, valsa em parceria com Adelmar Tavares, e o samba Dizem que amar
custa muito, também em parceria com Adelmar Tavares.
Heloísa
Helena foi uma cantora, atriz e diretora brasileira que fez muito sucesso a
partis de meados da década de 1930, estrelando filmes como Samba da Vida, de
1937. Neste filme ela canta músicas como Numa Roda de Samba, samba fox de sua
autoria em que canta em português e inglês. No filme, Heloísa Helena também
cantava em espanhol.
HELENA MENEZES SILVA
Compositora
do começo da década de 1930, era ligada à SBAT (Sociedade Brasileira de Autores
Teatrais). Teve composições gravadas por Sílvio Caldas e pelo Trio T. B. T.
Bidu Reis
era uma artista de múltiplos talentos, sendo cantora, poetisa, pianista, radio
atriz e compositora. Como cantora ela gravou sozinha ou fazendo parte do grupo
vocal As Três Marias, inicialmente ao lado de Marília Batista e Salomé
Cotelli. Compositora inspirada, entre suas músicas destaco o samba Bar da
Noite, gravado por Nora Ney em 1953 e Creuza Cunha em 1957, e o bolero Interesseira,
gravado em 1958 por Anísio Silva.
Dora
Lopes iniciou sua carreira de cantora em 1947, recebendo a nota máxima no
programa de calouros de Ary Barroso (uma notável conquista). Já em 1948,
gravava seu primeiro disco. Porém, ela também tinha muito talento como
compositora, tendo suas músicas gravadas por ela ou por grandes nomes de nossa
música, como Linda Rodrigues e Linda Batista.
AYLCE CHAVES
Paulista
de Itapetininga, Aylce de Vasconcellos Chaves, ou Aylce Chaves, começou a
compor em 1935. Suas primeiras composições foram, Até Logo e Quando a gente
ficar velho. Esta última, marcha em parceria com Linda Rodrigues e Amado Régis,
seria gravada pela própria Linda Rodrigues em 1945.
Um de
seus grandes sucessos, também gravado por Linda Rodrigues, foi o samba Lama, em
parceria com Paulo Marques, lançado em 1952.
Sofia
Gervazone, ou Linda Rodrigues, nasceu no Rio de Janeiro em 11 de agosto de
1919, falecendo nesta mesma cidade em 1997.
Foi uma
famosa cantora da década de 1950 e 1960, tendo iniciado sua carreira em 1945.
Ao longo de várias décadas gravou discos e se destacou, principalmente, com um
repertório romântico. Também foi compositora, tendo gravado algumas de suas
obras e tendo sido interpretada por colegas.
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