JOSÉ THEODORICO DE CASTRO Foto N. Olsen Século XIX Arquivo Marcelo Bonavides |
Ocorrida em 25 de março de 1884, uma
terça-feira, a libertação dos escravizados no Ceará antecipava-se em quatro anos a
Lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil. O Ceará passava a ser a primeira
província do país a tomar tal atitude, sendo considerado a Terra da Luz.
Segundo o pesquisador Nirez (Miguel Ângelo de Azevedo), o presidente da Província, Manuel Sátiro de Oliveira Dias (Sátiro Dias), decretou a Abolição dos escravizados em todo o território do Ceará em sessão realizada em pavilhão armado na Praça Castro Carreira. Em Fortaleza foram quatro dias de festas, mas em alguns lugares houve resistência e demorou ainda a libertação geral.
Cresci ouvindo histórias em torno da abolição e seus personagens, pois alguns de meus bisavós paternos, Maria Assumpção dos Santos Castro e José Theodorico de Castro era abolicionistas. Ela era uma das diretoras do grupo das Cearenses Libertadora, que tinha como diretora geral, Maria Tomásia Fugueira Lima. Ele era tesoureiro, também tendo sido vice-presidente, da Sociedade Cearense Libertadora (fundada em 08 de dezembro de 1880), cujo slogan era Perseverança e Porvir.
JOSÉ THEODORICO DE CASTRO Foto N. Olsen Século XIX Arquivo Marcelo Bonavides |
Albina
Também ouvi de sua filha, minha tia avó Cöra (que faleceu em 1991, aos 99 anos completamente lúcida) histórias sobre a ex-escravizada Albina, que após ser libertada ficou trabalhando na casa de meus bisavós. Albina tinha uma reza milagrosa que a livrava, e a seus companheiros de cativeiro, das perseguições de capitães do mato. Também fiquei sabendo que eles compravam escravizados para libertá-los. Até hoje, em minha casa, há o banco onde os ex-escravizados utilizavam para descansar e fazer suas refeições.
Quadro Abolição dos Escravos
Em 1938, o pintor cearense Raimundo Cela fez o quadro Abolição dos Escravos, onde ilustrou a Princesa Isabel em uma jangada, sendo recebida por vários ex-escravos e acompanhada de uma comitiva de abolicionistas. José Theodorico de Castro foi retratado ao lado de Dragão do Mar (Francisco José do Nascimento). No Museu do Ceará há um quadro com a fotografia de vários integrantes da Sociedade Cearense Libertadora, entre eles, José Theodorico de Castro.
Libertador, 25 de março de 1884 http://memoria.bn.br/ |
Quadro Abolição dos Escravos, de Raimundo Cela, 1938. Acervo da Academia Cearense de Letras http://laprovitera.blogspot.com
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Revendo a História
Fico feliz que meus bisavós tenham sido pessoas conscientes e engajadas em lutar contra uma trágica e vergonhosa passagem de nossa história, a escravidão, porém, a data também deve ser lembrada pela luta dos escravos e ex-escravos por sua liberdade, aos jangadeiros cearenses, representados por Dragão do Mar (Francisco José do Nascimento) que se recusaram a transportar escravos em suas jangadas para serem vendidos. A luta foi feita por muitos, mesmo que uns poucos tenham levado a fama.
Segundo o historiador Airton de Farias,
existiam alguns quilombos e alguns refúgios de escravos fugitivos, como o
quilombo na Serra Grande, acolhendo escravizados que vinham do Ceará, Piauí e
Maranhão. Em Tauape e Parangaba (hoje, bairros de Fortaleza), muitos escravos
encontravam acolhimento para suas fugas.
Por lei, os escravos não podiam usar sapatos, sandálias, nenhuma espécie de calçados, o que dificultava suas fugas. Muitos, ao fugirem, furtavam sapatos para serem confundidos como homens livres; outros, no Ceará, se misturavam entre os retirantes das secas. Outras formas de resistência iam do suicídio às conspirações e revoltas, como em 1867, em Icó, onde alguns escravos lutaram por sua liberdade usando armas, sendo reprimidos pela polícia local.
Libertador, 25 de março de 1884 http://memoria.bn.br/ |
Libertador, 25 de março de 1884 http://memoria.bn.br/ |
Resistências
O historiador Eurípedes Antônio Funes nos informa que “as festas constituíam para os escravos, momentos de ruptura com a vida cotidiana”, vestindo seus melhores trajes. Os espaços que melhor expressavam essa realidade, segundo Funes, eram as Irmandades dos Homens Pretos. “Eram espaços de sociabilidade, em que se reuniam negros libertos e cativos, cuidava-se da vida além da morte”, realizando enterros e mandando rezar missas para encomendar a alma. “No Ceará, uma das Irmandades dos Homens Pretos mais presente foi a de Nossa Senhora do Rosário”, espalhadas por várias cidades, entre elas, Fortaleza. Outras resistências culturais se manifestavam e ainda se manifestam, como o Maracatu, onde a Kalunga, “que não é um simples adereço, mas a representação de uma entidade que protege, guarda, a nação de brincantes”.
Trago a gravação de Terra da
Luz, de Humberto Teixeira, realizada por Déo e o Coro dos Apiacás em 1945 e
algumas manchetes de jornais cearenses e carioca sobre a data de 25 de março de
1884.
Libertador, 25 de março de 1884 http://memoria.bn.br/ |
Cearense, 25 de março de 1884 http://memoria.bn.br/ |
Gazeta de Notícias, 25 de março de 1884 http://memoria.bn.br/ |
LIBERTADOR, Terça-Feira, 25 de março
de 1884
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