Eva Todor foi uma grande atriz que continua merecendo todas as nossas homenagens.
Trago uma reportagem onde ela ensinava a como se descobrir um peça de teatro,em 1941.
Com mais de 83 anos de carreira, Eva encantou gerações com seu talento, seja no teatro, cinema ou televisão.
Nascida na Hungria em 1919, veio menina ao Brasil e ainda adolescente iniciou carreira no teatro, tendo brilhado no teatro de revista dos anos 30 ao lado de grandes nomes como Aracy Côrtes, Alda Garrido e Francisco Alves.
Seu último trabalho foi na novela Salve Jorge, de Glória Perez, exibida pela Rede Globo em 2012.
Eva Todor faleceu em 10 de novembro de 2017, aos 98 anos.
COMO SE DESCOBRE UMA PEÇA
Em 13 de dezembro de 1941, a revista O Cruzeiro publicou a reportagem de Márcio Cunha intitulada COMO SE DESCOBRE UMA PEÇA. Nela, o repórter iniciava chamando a atenção sobre o fato de a maioria do público quando vai assistir a uma peça ignorava todo o trabalho que havia sido feito para ela ser exibida, o esforço em conjunto dos que apareciam em cena e dos que permaneciam ocultos nos bastidores. Mas, havia um trabalho maior que todos esses. Era, justamente, a escolha da peça a ser montada.
E com a pergunta "Como se escolhe uma peça?", Márcio Cunha chegou ao elegante apartamento do diretor, empresário e compositor Luiz Iglezias, localizado em Ipanema (RJ). Luiz respondeu:
- Passando noites inteiras acordado - lendo, lendo, lendo infatigavelmente - em português, francês, inglês, espanhol, italiano, alemão e até húngaro!
- Você conhece também alemão e húngaro? (perguntava o repórter).
- Não, essas línguas são familiares à Eva Tudor, primeira atriz de minha companhia e, há oito anos, longos e felizes, dominadora absoluta do lar desse seu creado...
- Então...
- Sei que vai me fazer duas perguntas inevitáveis em tais circunstâncias, e apresso-me a respondê-las. Primeiro, Eva, apesar de sua juventude, está casada comigo há oito anos, isto é, desde os quatorze - segundo, além de ser uma atriz brilhante e personalíssima (segundo a crítica unânime, e a minha opinião pessoal, inteiramente franca) é uma companheira ideal, inteligente e possuidora de um raro sentimento artístico que a faz conhecer imediatamente, deante de um original, se vai agradar ou não. Assim, além de me auxiliar grandemente na leitura das peças, preferentemente em alemão e húngaro, línguas que lhe são familiares, pois nasceu em Budapest, é a primeira pessoa a quem entrego os meus originais, com absoluta confiança em sua crítica sagaz e construtiva. Eva...
- Estão falando de mim? Bem ou mal?
"A creadora inimitavel de Chuvas de Verão e Sol de Primavera, acabava de entrar com sua esfusiante alegria, uma garota autêntica em seu elegante pijama caseiro".
- Estava explicando, como é difícil escolher uma peça - dizia seu esposo.
- Difícil? Verdadeiro pesadelo! Organizar repertório para uma temporada, representa o esforço bem maior, para os responspaveis por uma companhia, do que todo o trabalho de ensaiá-la e apresentá-la ao público. Agora mesmo, para chegarmos a resolver sobre a última peça que levaremos no Rio, antes da excursão às Estações de Águas e ao Norte, tivemos que ler nada menos de trinta e cinco originais, em sete idiomas. Está será, provavelmente "Una noche de Pirmavera sin sueno", uma deliciosa comédia romântica do escritor espanhol Enrique Jardiel Poucela.
Luiz Iglezias voltou a falar, dizendo:
- Depois da escolha, devo procurar obter os direitos de tradução, em se tratando de obra estrangeira, e eu mesmo me encarrego, em gral, desse trabalho, sendo necessário na maior parte das vezes, adaptá-la, não só ao nosso ambiente, e muitas vezes ao tipo dos intérpretes disponíveis. É uma batalha insana, onde conto também, ainda uma vez com o auxílio de Eva, que interpreta para que eu sinta o efeito de certas falas, não só o seu papel, como os outros, inclusive os masculinos... Aliás, esses são os bons momentos do trabalho, porque então me faço de espectador. Veja só - espectador único de uma grande atriz!
- Olha a máscara... E se fico convencida?
Luiz Iglezias sorriu.
- Eu sei uma receita infalível para isso. Mas por enquanto não é necessária.
Sobre quantos dias eram necessários, em média, para uma escolha, Luiz afirmou:
- Depende Muitas vezes em poucos minutos descobrimos a mina, mas geralmente muitos dias se passam até o momento em que resolvemos finalmente sobre um original. Decepcionante se torna, porém, quando depois de tudo, quando por um motivo qualquer (impossibilidade de obter os direitos, por exemplo) todo esse trabalho se torna inútil. O ideal, seria, que existissem autores que escrevessem comédias, especialmente para Eva. Isso acontece, de quando em quando, e eu mesmo o tenho feito algumas vezes. Mas, em geral, aqui, como em toda a parte, os diretores é quem devem procurar a peça para os personagens... O resto, apesar de trabalhoso, é quase nada...
- Quase nada comparativamente. mas custa muito, principalmente quando temos que abandonar essa paisagem maravilhosa de Ipanema, num dia lindo assim, para ensaiar horas a fio, na certeza de que à noite temos duas seções ainda para representar!
Mas isso era outra história. Nós a contaremos oportunamente. Assim terminava a reportagem de Márcio Cunha.
Agradecimento ao Arquivo Nirez
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