Há exatos 136 anos acontecia a Missa Campal celebrada em ação de graça pela Abolição da Escravidão no Brasil.
O evento ocorreu em 17 de maio de 1888, também em um domingo, no Campo de São Cristóvão, no Rio de Janeiro.
O EVENTO
Dias antes, em 13 de maio, a Princesa Imperial Regente, D. Isabel, havia assinado a Lei Áurea, que extinguia a escravidão no país.
A fotografia da missa campal foi feita do alto pelo fotógrafo Antonio Luiz Ferreira, e é possível ter uma ampla vista do campo lotado de pessoas. Em um pequeno palanque decorado, à esquerda da foto, no lado de cima, está a Princesa Isabel e seu esposo, o Conde D´Eu.
O site Brasiliana Fotografia, ligado à Biblioteca Nacional, conseguiu identificar, ampliando a fotografia, o escritor Machado de Assis e o jornalista José do Patrocínio, junto de seu filho, o futuro dramaturgo José do Patrocínio Filho, aos três anos. Eles estavam bem próximos à princesa. Todas essas fotografias são do site http://brasilianafotografica.bn.br/?page_id=736 , que apresenta um interessante artigo sobre a imagem e a descoberta dos integrantes ilustres.
Após a missa, José do Patrocínio convidou seu amigo Machado de Assis (que fora em sua companhia ao evento) para almoçar em sua casa. As demais integrantes do palanque foram a um almoço festivo no Internato do Colégio Pedro II.
A fotografia de Antonio Luiz Ferreira, além de ser um documento histórico de grande valor, é um registro impressionante de pessoas e seus rostos. Vemos pessoas negras e brancas juntas e comemorando o fim de uma grande vergonha nacional, a escravidão. Alguns estão sérios, outros sorriem, uns lançam um olhar curioso. Cada rosto é uma história de vida e todos buscam a lente da câmera. Sugiro a vocês ir nesse link http://zip.net/bgrgt0 e ampliar a fotografia. Felizmente, podemos ampliá-la ao máximo. No início a imagem aparece borrada, mas, logo fica nítida. Assim, podemos ver os detalhes daquelas pessoas, suas roupas, chapéus, o que seguravam, enfim, de certa forma conseguimos estar lá com eles, sentindo a mesma emoção.
Detalhes da fotografia
A CANÇONETA
Na época desse grande acontecimento o teatro de revista estava consolidado em nosso país e a Abolição foi um ótimo tema para homenagens e referências pelos revistógrafos. Como o teatro de revista apresentava músicas cômicas, picantes e satíricas, abordando vários temas, a Missa Campal do dia 17 de maio foi a inspiração para uma cançoneta que iria fazer muito sucesso no restinho de século que faltava e no início do século XX.
A música chamava-se Missa Campal e foi lançada na revista (peça) intitulada 1888, da autoria de Raul Pederneiras, que estreou em 27 de dezembro no teatro Variedades Dramáticas. Seu criador nos palcos foi o célebre ator Machado Careca. A melodia era de uma canção francesa, da autoria de Lesorn. Mesmo com o êxito obtido, teve críticos que a combateram. Mas, o sucesso prevaleceu e a famosa cançoneta seria gravada em 1902 pelo pioneiro cantor de discos Bahiano (Manuel Pedro dos Santos), que a regravaria em dezembro de 1913.
A revista que a música cita, provavelmente, seria a revista de tropas feita pela guarda imperial.
Degas, no contexto, era uma gíria da época para definir um sujeito contador de vantagens, um "sabichão".
Matolatagem é o mesmo que mantimentos, suprimentos.
Ator Machado, também conhecido por Machado Careca. Arquivo Nirez. |
Bahiano, nome artístico de Manuel Pedro dos Santos. Arquivo Nirez. |
MISSA CAMPAL
Cançoneta gravada por Bahiano
Disco Odeon Record 108.717
Matriz XR-1364
Lançado em 1913
Tendo um gênio vivo e pagodista
para a bela pândega descaio
Fui com a família pra revista
em honra do Treze de Maio
Ai, que prazer calmo e jocundo
Íamos os quatro a dois de fundo
A mãe e a filha, a frente guarda
e eu, com a sogra, na retaguarda
Cada um, para a viagem,
levou matalotagem
Cá, o Degas, todo o pão levou
a esposa, o queijo, nada mal
A sogra preparou bolos e bacalhau
E a menina, um belo angu
de quicopós e caruru
Bem contentes e diligente
pra São Cristóvão fomos nós todos, afinal.
Os quatro a rir, para poder assistir
ao desfilar das tropas
e à Missa Campal
Íamos de carro e, de repente
lá surge a tropa, bela vista!
De cada corpo, um contingente
marchava à largo pra revista
Uma das bestas, espantada
levou a outra em disparada
Ai, que sarilho,
Ai, que escarcéu
Perdi o pão, perdi o chapéu
A pobre sogra ver bem, não logra
Na confusão entra a gritar
frente a mim para saltar
Porém, no repelão
Coitada, foi ao chão
De forma tal que, por um triz
no olho entrou-lhe o meu nariz
Mas passado o caso desastrado
a pé pra São Cristóvão fomos, nós, afinal
Os quatro a rir para poder assistir
ao desfilar das tropas e à Missa Campal.
Ao campo, enfim, ei-nos chegado
na relva fomos sentar
Já pela fome torturados
Entramos logo a manducar
A revista a começar
Trepei nos ombros da mulher
e está, na filha que, pra ver
trepara mais atrás aos ombros dum rapaz.
A sogra não vê bem
trepar em todos quer, porém,
coitada foi ao chão do alto do lampião
E foi a queda tão aguda
que a pobre velha ficou muda.
Vale conhecer.
ResponderExcluirMarcelo!Agradeço imensamente sua pesquisa tão necessária e por compartilhar!!
ResponderExcluirObrigado Amanda!!
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