Fanny Elssler, como Florinda, caracterizada para dançar a Caxuxa, Ballet Le Diable boiteux, 1836. |
Há muitos anos, quando li pela primeira vez o livro O Mulato, de Aluísio de Azevedo, achei interessante a passagem em que o ator narrava um velório. Durante a madrugada, enquanto várias pessoas desempenhavam diferentes funções, havia um grupo de mulheres que conversavam e contavam causos, velando a morta. Uma delas disse, "muito sentida, a história de um papagaio de grande estimação, que ela possuía, e que, um belo dia, cantando, coitado! a "Maria Cachucha", caíra para três - morto!".
Eu fiquei curioso sobre essa música e fui procurar informações.
Aqui, divido com vocês os dados interessantes que eu encontrei.
A CAXUXA
Embora a grafia estrangeira (e atual) seja Cachucha, irei usar a forma brasileira e original do século XIX, Caxuxa.
O blog http://www.streetswing.com/, afirma que a Caxuxa (La Cachucha) foi criada em Cuba em 1803, mas que é considerada uma dança espanhola. Não se conhecem o autor da dança ou música.
A bailarina austríaca Fanny Elssler (1810 - 1884) a tornou famosa em em uma coreografia de sua autoria, datada de 1830, para o ballet La Donna del Lago, de Rossini, em Londres.
Em 1836, Fanny Elssler tornaria sua coreografia mais popular, sapateando e tocando castanholas, num começo lento que ia pegando ritmo até terminar com rápidos volteios. Essa versão fazia parte do ballet Le Diable boiteux, de Jean Coralli e Gide, onde ela interpretava Florinda.
Fanny chegou a se apresentar na Ópera de Paris com sua dança que, felizmente, foi registrada por ela em detalhes, fazendo com que as/os futuras(os) bailarinas(os) pudessem recriá-la. A dança também lembrava o fandango e o bolero (este, o do século XIX). Nos EUA, ela apresentou-se na Casa Branca e o Congresso decidiu que não haveria reunião quando ela estivesse dançando.
A divulgação, ao menos no Brasil, não demorou a acontecer. Em 1830 os jornais de Pernambuco e do Rio de Janeiro já divulgavam a Caxuxa (dança), antes mesmo desta se tornar um sucesso mundial.
Em 1840 encontramos mais registros da Caxuxa (dança e música) no Brasil. A coreografia passou a ser conhecida pelas principais dançarinas dos grandes teatros da corte e pelo resto Brasil.
Já em 1864, aparecia nos jornais de Cuiabá.
Já em 1864, aparecia nos jornais de Cuiabá.
Era um número artístico que os jornais faziam questão de divulgar com destaque. Ao final desse artigo confiram os recortes de jornais do século XIX falando sobre a Caxuxa. Ao que parece, havia uma versão da dança para o teatro e outra para os salões, esta, provavelmente executada em saraus e mais contida.
A palavra Caxuxa também significava barco pequeno.
O ballet La Donna del Lago foi inspirado no poema Lady of the Lake, de Sir Walter Scott, de 1810.
O ballet La Donna del Lago foi inspirado no poema Lady of the Lake, de Sir Walter Scott, de 1810.
Fanny Elssler. Litografia de Joseph Kriehuber de 1830. http://www.loc.gov/ |
Fanny Elssler. |
A Caxuxa, coreografia de Fanny Elssler, interpretada por Margaret Barbieri, versão A:
A Caxuxa, coreografia de Fanny Elssler, interpretada por Margaret Barbieri, versão B:
La Cachucha, por Carla Fracci:
La Cachucha
MARIA CAXUXA
Como ocorre com melodias famosas, a Caxuxa recebeu uma versão em Portugal que, de certa forma, ganhou vida própria independente da coreografia. Também vinda ao Brasil, fez sucesso por ter versos picantes, de duplos sentidos. As datas se confundem. No livro A História do Fado, de Pinto de Carvalho (Tinop), de 1903, os versos aparecem datados ainda de 1802, um ano antes da dança ter sido criada.
Há uma versão conhecida até hoje pelos mais idosos: "Maria Caxuxa, com quem dormes tu?/ Eu durmo sozinha com o dedo no ...".
Ou: "Maria Caxuxa, com quem dormes tu?/ Eu durmo com um gato que me arranha o ...".
Essa versão explícita (que não preciso colocar na integra aqui) era cantada e divulgada pelo povo. Porém, os versos que chegaram até nós não são nada inocentes. A segunda versão foi gravada pela mezzo soprano e pesquisadora, anna Maria Kieffer.
Em 1939, Joel e Gaúcho gravaram a marcha "Maria Cachucha", de Antônio Almeida e Saint Clair Sena.
Em 1940 o dramaturgo Joracy Camargo escreveu a comédia Maria Cachucha.
O termo "Do tempo da Maria Caxuxa" significa algo muito antigo.
Há também um doce chamado Maria Cachucha.
Há também um doce chamado Maria Cachucha.
Maria Caxuxa, século XIX
Com Anna Maria Kieffer
Maria Caxuxa, com Joel e Gaúcho
De Antônio Almeida e Saint Clair Sena
1939
A História do Fado, de Pinto de Carvalho. |
A CAXUXA NA IMPRENSA
Diário do Rio de Janeiro, Terça-Feira, 23 de Novembro de 1830
Diário de Pernambuco, Quarta-Feira, 09 de Junho de 1830
Diário de Pernambuco, 10 de Março de 1840
Diário de Pernambuco, Quarta Feira, 22 de Abril de 1840
Diário de Pernambuco, Sábado, 20 de Junho de 1840
A Imprensa de Cuiabá, Quinta-Feira, 28 de Abril de 1864
Diário do Rio de Janeiro, Sábado, 29 de Janeiro de 1842
Correio Mercantil, Terça Feira, 01 de Agosto de 1848
Excelente postagem! Bem completa. Eu ouvi essa canção no Youtube e fiquei curiosa em saber o que significava caxuxa e no meio das minhas pesquisas encontrei seu blog.
ResponderExcluirMuito obrigada por compartilhar esse belo trabalho com os leitores. O nosso país é rico em história. É sempre bom lermos sobre o passado do Brasil. Ademais, sucesso para o blog.