domingo, 15 de setembro de 2024

COMO SE FAZ UM SAMBA - 1936

Arquivo Nirez




Uma interessante matéria foi publicada na revista Carioca de 18 de janeiro de 1936.
Intitulada Como Se Faz Um Samba, nos dava uma ideia de como eram feitos, se não todos, muitos dos sambas e composições dos anos 30.
Fiz uma matéria em cima do que foi publicado.


Como Se Faz Um Samba

O cenário, geralmente, era o mesmo: uma mesa de café e alguns sambistas (três ou quatro). Mais do que isso, “não dava certo”. A localização do café cariava. Às vezes era na Avenida Rio Branco, mas, podia ser também no Estácio. Aliás, geralmente, era dalí que tinham saído os melhores sambas, pois, “o sambista que se preza não abandona o Estácio...”.
A reunião acontecia sempre depois de meia noite. Antes disso, não haveria tempo do “malandro” sentir a bossa. Três, quatro horas da madrugada, era o ideal. Mais cedo, só quando eram sambas feitos na Avenida...
A inspiração nunca faltava, chegava sempre. O motivo podia ser encontrado nas coisas mais insignificantes: um homem que entra para vender bilhetes, um sujeito que bate na porta, um garçom que demora em trazer a média, uma notícia de sensação nos jornais, às vezes um simples anúncio pregado na parede e tínhamos a melodia já encaminhada pelo tamborilar dos dedos na mesa do café ou em uma caixa de fósforos. Às vezes, o chapéu de palha entrava em cena. Findando a noite, o sambista se retirava para sua casa, levando no ouvido a música e, não raro, as palavras.

Mas, nem todos os sambas eram feitos assim. Muitos surgiam após uma briga com a pequena: aí, eram os sambas sentimentais.
Ao invés de ser imaginado em um café, o sambista buscava um local quieto, longe de ruídos e até mesmo dos companheiros.

E assim se faziam is mais belos sambas, dos quais Pra Esquecer era o padrão.
Com o ouvido cheio da melodia da véspera e a memória ainda transbordante do ritmo da música improvisada, o sambista ia no dia seguinte procuram por quem lhe escreva a música, pois, a maioria era leiga no assunto e desconheciam as notas musicais. Sabiam murmurar os compassos que eram impedidos de traduzir no papel.

A reportagem citava Aldo Taranto, “a creatura que vae resolver as difficuldades em que se encontra o autor da música”. Aldo rascunhou O Teu Cabelo Não Nega, Linda Morena, Trem Blindado, Garota da Rua, Agora é Cinza, A Tua Vida é um Segredo...
Diante dele, o sambista punha-se a cantar a melodia e Aldo, exímio pianista, rapidamente ia transportando ao piano o que ouvia ser cantarolado. Do piano, para a pauta musical, era uma pequena distância. Aldo se dedicava a isso desde 1931. Muitas músicas e sucessos já haviam passado por suas mãos, nesse sistema.

Mesmo os sucessos escritos e adaptados por ele, tinham seu nome omitido na hora de ser anunciado por um speaker, por exemplo.

Já tendo passado por Aldo, onde o samba era interpretado ao piano, o sambista ia procurar o que lhe faltava: a orquestração. Não raro, uma orquestração bem feita era o maior fator de êxito de uma música, e dela dependia sempre “mais de 50 por cento de seu sucesso...”.

Rua do Chichorro, 25, sobrado.
Subia-se uma escada e logo uma voz amável atendia a reportagem:
- Queiram se sentar.
O repórter estava diante de Alfredo Vianna, o Pixinguinha.  Era ele quem fazia a orquestração (entre outros maestros).
Pixinguinha possuía, como ninguém, uma alta dose de senso do efeito que podem causar ao público os vários tipos de orquestração.
Conhecia e sabia perfeitamente quais modulações que deveriam ser colocadas e o seu resultado: Ride, palhaço, Foi Ela, Formosa, O Teu Cabelo Não Nega, entre outros.
E ele ainda dizia:
- Esse ano (janeiro de 1936) tive poucas músicas. Umas oitenta mais ou menos. Não é nada, em relação ao ano findo (1935), em que tive quatrocentas...
Lhe perguntaram se o carnaval estava fraco.
- Não, responde o maestro, apenas houve um pequeno atraso. No ano passado, por esta época, os estúdios de gravação já tinham encerrado os seus trabalhos. Este ano, agora é que estão começando a atividade...

Como dizia o repórter, ao sair da casa de Pixinguinha, ele era o homem que mais músicas tinha orquestrado, sendo o ponto final da confecção do samba.

Assim, não faltava mais nada para o samba ser lançado. Aliás, faltava apenas uma coisa: um nome de cartaz que gostaria de cantá-lo. Essa fase podia ser a mais difícil para o sambista, se ele fosse pouco conhecido. Dificilmente um cantor famoso lançaria um samba de um desconhecido. As cantoras preferiam lançar composições de pessoas já conhecidas. Assim, podiam começar as desilusões e os padecimentos: “ ‘contras’, estações de rádio que para ele se fechavam, diretores ‘que não estavam em casa’, etc. E o sambista desconhecido via que o ambiente era contra ele e que suas ilusões, uma a uma, iam sendo desfeitas.

“E o malandro soffredor volta e na mesa do café compões uma melodia talvez mais linda que a outra, narrando a amarga história de um samba que foi recusado e ninguém quis cantar...”, assim terminava a reportagem.



Nota do autor do Blog

É uma matéria bem interessante que nos mostra o processo que algumas composições levavam para chegar ao ouvido do público. Com certeza esse caminho era menor para composições de pessoas que conheciam música, como o próprio Pixinguinha e Aldo Taranto.

Mas, nos mostra onde geralmente surgia um samba, os parceiros (nem sempre creditados), o arranjo a ser feito em cima da melodia e a busca de um intérprete para gravá-lo e divulgá-lo. Sabemos de várias histórias de músicas recusadas por cantores e cantoras e de compositores que buscavam determinados intérpretes para gravarem suas músicas. Era muito mais fácil quando intérprete e compositor eram amigos, assim, tudo acontecia de forma rápida e até divertida.





Fotos da matéria
Obs. A revista trocou as legendas de Pixinguinha e Aldo Taranto.




Arquivo Nirez



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ALDO TARANTO
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PIXINGUINHA
Arquivo Nirez




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Arquivo Nirez














Agradecimento ao Arquivo Nirez










Um comentário:

  1. Parabéns pelo blog!
    O conteúdo é muito interessante.
    A. Mandel

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