quarta-feira, 30 de outubro de 2024

RELEMBRANDO O ATOR E COMPOSITOR XISTO BAHIA

XISTO BAHIA
Arquivo Marcelo Bonavides





Vamos relembrar 0 compositor e cantor Xisto Bahia, uma dos maiores artistas que já tivemos.

Xisto de Paula Bahia nasceu em Salvador, na Freguesia de Além do Carmo, em 06 de agosto de 1841. Era filho do major do Exército Francisco de Paula Bahia e de D. Tereza de Jesus Maria do Sacramento Bahia. Era o caçula dos irmãos Soter, Francisco bento, Horácio e Eulália.    


Como Xisto Bahia ele entraria para a história da MPB como o autor da primeira música lançada em disco no Brasil, o lundu Isto é Bom, também conhecida como Yayá você quer morrer?, composta por volta de 1857 e que foi levada à cera em 1902 pelo cantor Bahiano (Manuel Pedro dos Santos), que também era baiano.

Porém, o legado de Xisto Bahia foi bem maior. Além, de ator, compositor e cantor, ele também era violinista, violonista e dramaturgo.

Em 1861, excursionou pelo norte e nordeste do Brasil, cantando modinhas, e lundus, tocando violão.
O dramaturgo Arthur Azevedo o considerava o ator mais nacional que tivemos. Aliás, foi em uma peça de Arthur, Uma Véspera de Reis, que Xisto obteve um de seus maiores êxitos como ator.

Em 1880, D. Pedro II o aplaudiu na peça Os perigos do coronel.


Durante o ano de 1881, foi escrevente penitenciário em Niterói (RJ).


Jornal O Paiz, sábado, 29 de janeiro de 1887.
Biblioteca Nacional.


A peça O Carioca, da autoria de Arthur Azevedo e Moreira Sampaio, estreou no Imperial Theatro Dom Pedro II, em 31 de dezembro de 1886, sendo a revista desse mesmo ano.

Para quem não está familiarizado, a palavra revista, empregada nessa postagem, se refere à peça de Teatro de Revista, às Revistas de Ano, que eram populares no final do século XIX e que eram uma revisão através de uma peça dos acontecimentos do ano que terminava. Quando formos nos referir à revistas de papel usaremos o termo periódico, que também pode se referir a um jornal, assim evitaremos maiores confusões.

No elenco estavam Cinira Polônio, Francisco Correia Vasques, Rose Villiot, Antonio Joaquim de Mattos, a célebre atriz do Alcazar Lyrico Delmary, a famosa Adelaide do Amaral (que rivalizava nos palcos com Eugênia Câmara), Aurélia Delorme, entre outros e, com destaque, Xisto Bahia.

Esse elenco era formado por alguns dos maiores nomes do meio teatral da época.

Foi casado com a atriz portuguesa Maria Vitorina de Lacerda Bahia, com quem teve quatro filhos.

Durante o Segundo Reinado, suas modinhas e lundus se tornaram célebres. Podemos destacar o poema de Plínio de Lima, Ainda e Sempre (Quis debalde varrer-te da memória), que ele musicou; bem como o excelente lundu A Mulata (Mulata Vaidosa), Preta Mina.

Xisto Bahia faleceu em Caxambu, em uma terça-feira, a 30 de outubro de 1894.



Jornal O Paiz, quarta-feira,
31 de outubro de 1894.
Biblioteca Nacional.


Em 1895 foi criado o periódico Xisto Bahia, provavelmente para ajudar a viúva e seus filhos, que ficaram em extrema pobreza.


Obs. As três imagens abaixo foram retiradas do artigo "Xisto Bahia: ilustre e desconhecido", da autoria do Prof. Dr. Luciano Caroso. Disponível em: https://antigo.anppom.com.br/anais/anaiscongresso_anppom_2006/CDROM/COM/04_Com_Musicologia/sessao04/04COM_MusHist_0403-162.pdf



Biblioteca Nacional
Artigo "Xisto Bahia: ilustre e desconhecido",
da autoria do Prof. Dr. Luciano Caroso




Intituto Moreira Salles - SP
Artigo "Xisto Bahia: ilustre e desconhecido",
da autoria do Prof. Dr. Luciano Caroso



Capa manuscrita da peça Uma véspera de Reis, 1882.
Biblioteca Nacional
Artigo "Xisto Bahia: ilustre e desconhecido",
da autoria do Prof. Dr. Luciano Caroso






Xisto Bahia caracterizado como Bermudes, em Uma Véspera de Reis (1875), de Arthur Azevedo.
Foi um de seus maiores sucessos no teatro.
Almanaque d´O Theatro, 1907.





Vida Fluminense, 1890
http://memoria.bn.br/




Revista Theatral, 1894
http://memoria.bn.br/




Revista Theatral, 1894
http://memoria.bn.br/





XISTO BAHIA
Arquivo Nacional
https://sian.an.gov.br/




Confiram as composições de Xisto Bahia que foram gravadas na primeira década do século XX:  


Obs. As imagens aqui disponibilizadas das partituras "Yáyá, você quer morrer?" e "Ainda e Sempre - Quiz debalde varrert-te da memória", pertecem ao projeto Impressão Musical da Bahia, liderado pelo Prof. Dr. Manoel Veiga.




ISTO É BOM (YAYÁ VOCÊ QUER MORRER?)


Como já dissemos, Isto é Bom foi a primeira música lançada em disco no Brasil, isso porque no selo do disco a numeração vem como 10.001, no primeiro suplemento de chapas para gramofones (discos 78 rpm) lançado ao mercado. A gravação foi feita na Casa Edison, do Rio de Janeiro, de propriedade de Frederico (Fred) Figner, em 1902 e o disco foi impresso na Alemanha sob o selo Zon-O-Phone. Coube ao então cançonetista de sucesso, Bahiano (Manuel Pedro dos Santos) fazer uma série de gravações para serem lançadas em discos, cabendo a Isto é Bom receber a numeração 10.001. No ano seguinte, saia no mercado um novo lote de discos Zon -O-Phone gravados por Bahiano; entre eles, o de número X-1.031, que foi gravado em 1902, mas lançado em 1903. Pode ser uma nova gravação do lundu de Xisto Bahia ou um relançamento da gravação original (a que saiu na chapa pioneira). Chegou aos nossos dias, por enquanto, o disco X-1031, de 1903; ou seja, Bahiano interpreta a primeira música gravada no Brasil, mas, pode ou não ser a gravação pioneira. Ainda não surgiu provas que confirmem uma ou outra versão. Podemos observar nessas gravações de 1902 e 1903 um constante acompanhamento de piano, que era o instrumento indispensável onde se pensasse em fazer música. Dessa forma, podemos ter uma boa ideia de como seriam os saraus de outrora, como era a interpretação dos cantores, a forma de dizer as gírias, soltar os chistes e cantar o lundu. Teremos uma outra forma de interpretar ao ouvirmos Eduardo das Neves com seu violão.

Daí, saímos dos salões para irmos às rodas de serenatas, onde o violão era o destaque. A interpretação, mais solta, mais despreocupada, nos mostra como os boêmios e chorões executavam suas músicas, atraindo a atenção dos presentes aos lundus e modinhas dos tempos do Império e dos primeiros anos da República.


É uma viagem no tempo, onde vozes, instrumentos e interpretações nos remetem a um tempo onde se faziam choros nas calçadas, onde podíamos topar na rua com algum célebre compositor de polcas ou cançonetas e a vida passava no compasso de um chorinho dos velhos tempos. O convite está feito!



http://www.nemus.ufba.br/Asp/ImprScan.asp?Exmp=MIS_001




ISTO É BOM
Lundu cantado por Bahiano
Acompanhamento de piano
Gravação de 1902
Disco Zon-O-Phone 10.001
Gravado e lançado em 1902



ISTO É BOM
Lundu cantado por Bahiano
Acompanhamento de piano
Gravação de 1903
Disco Zon-O-Phone X-1.031
Gravado em 1902 e lançado em 1903





ISTO É BOM

https://discografiabrasileira.com.br/

Lundu gravado por Eduardo das Neves
Acompanhamento de violão
Disco Odeon Record 108.076, matriz XR-607
Lançado em 1907
OBS. Eduardo chega a comentar na gravação: Ah, isso me lembra do tempo do Xisto Bahia!
E depois: Meu Deus, que festa no tempo do seu Xisto!






Isto é Bom também foi gravado por Vanja Orico em duas ocasiões, em 1953 e 1955, com o título de Yayá vancê quer morrer?


IAIÁ VANCÊ QUER MORRER?
Lundu
Gravado por Vanja Orico
Acompanhamento de Orquestra
Disco RCA Victor 80-1245-A, matriz BE3-VB-0295
Gravado em 11 de novembro de 1953





IAIÁ VANCÊ QUER MORRER?
Toada (assim veio no selo do disco)
Gravada por Vanja Orico
Acompanhamento de Conjunto e Coro
Disco Sinter 00-00.396-B, matriz S-876
Lançado em maio/junho de 1955






QUE VALEM FLORES?

https://discografiabrasileira.com.br/

Modinha de Xisto Bahia em interpretação de Geraldo Magalhães.
Disco Odeon Record 40.567
Acompanhamento de Piano
Lançado em 1905






AINDA E SEMPRE (QUIS DEBALDE VARRER-TE DA MEMÓRIA)



Uma belíssima e sentida modinha, com letra do poeta baiano, de Caetité, Plínio de Lima (1845-1873), que foi musicada por Xisto Bahia. 

Fez muito sucesso na virada do século XIX para o XX.

Foi gravada por Mário Pinheiro em 1909.



Plínio de Lima
https://pt.wikipedia.org/


Capas de partituras de Ainda e Sempre (Quiz debalde varrer-te da memória)


http://www.nemus.ufba.br/Asp/ImprScan.asp?Exmp=CFA_002


http://www.nemus.ufba.br/Asp/ImprScan.asp?Exmp=BAN_004



AINDA E SEMPRE (QUIS DEBALDE VARRER-TE DA MEMÓRIA)


https://discografiabrasileira.com.br/

Canção de Xisto Bahia e Plínio de Lima
Gravada por Mário Pinheiro
Acompanhamento de piano
Disco Odeon Record 108.222, matriz XR-759
Lançado em 1909







MULATA VAIDOSA


Esse é um delicioso lundu com versos de Mello de Moraes Filho que Xisto Bahia musicou.
Retrata a mulata como personagem sensual.
Provavelmente foi cantado por atrizes em teatros ou cafés-concertos. Porém só homens gravaram no período do 78 rpm, e todos na década de 1900. É curioso isso, uma vez que algumas composições com versos femininos foram gravadas por homens.

Aqui, temos Mário Pinheiro cantando com desenvoltura. Em certo momento da gravação ele brinca e diz: Até virei mulata, calcula?!



MULATA VAIDOSA

https://discografiabrasileira.com.br/

Tango (Lundu) de Xisto Bahia
Gravado por Mário Pinheiro
Acompanhamento de violão
Disco Victor Record 98.971
Lançado em 1910





Encontrei dois vídeos com interpretações dessa música. Em um deles, o grupo Quadro Antiquo interpreta Mulata Vaidosa, também conhecida como A Mulata.

No outro, apenas gravação, temos o grupo Lira D´Orfeo.

É uma boa oportunidade de vermos o lundu interpretado por duas cantora em sua forma original, embora com interpretações diferentes.



Quadro Antiquo 
Percussão - Kristina Augustin
Flauta doce - Mario Orlando
Canto - Sonia Wegenast
Violão - Rosiamery P. Gomes
Concerto no Museu da Imagem e Som (MIS) Maceio- (AL).
Março de 2009







O PESCADOR 


Lundu que fez parte da peça O Homem, estreada no Theatro Lucinda (ou Éden Dramático), o primeiro teatro do Rio de Janeiro a instalar iluminação elétrica, em 03 de janeiro de 1888, que era uma revista do ano de 1887. Da autoria de Arthur Azevedo e Moreira Sampaio, era baseada também no romance homônimo do irmão de Arthur, Aluísio de Azevedo. No elenco, ao lado de Xisto Bahia, Machado Careca, Cinira Polônio, Blanche Grau, Antônio Joaquim de Mattos, Anna Manarezzi, entre outros.


A música é uma interessante crônica/crítica à pescaria em sempre em voga, ou seja, a pratica de as pessoas darem-se bem ou arranjarem-se como podem, sejam nos negócios ou nas relações pessoais.


O PESCADOR

https://discografiabrasileira.com.br/

Lundu de Xisto Bahia
Gravado por Eduardo das Neves
Acompanhamento de Violão
Disco Odeon Record 108.710, matriz XR-1353
Gravado em 1912 e lançado em 1913





O Pescador também foi gravado pela cantora Maria Martha, acompanhada por Raphael Rabello, Luciana Rabello e Celsinho, em 1978.







PRETA MINA


Lundu de Xisto Bahia que teve várias gravações.

O interessante é que no disco a o ritmo vem como modinhapolca e até tango. Vale lembrar que na virada do século XIX para o XX a palavra tango ou tango brasileiro significava maxixes ou lundus. Uma forma que o compositor Ernesto Nazareth e outros colegas, como Chiquinha Gonzaga e Nicolino Milano, usavam para que suas melodias populares pudessem entrar em casas de família.


Preta Mina
Polca de Xisto Bahia
Gravado pela Banda da Casa Edison
Disco Odeon Record 10.048, matriz R-197
Lançado em 1904





Preta Mina
Modinha de Xisto Bahia
Gravado por Mário Pinheiro
Disco Odeon Record 40.406
Lançado em 1905





PRETA MINA

https://discografiabrasileira.com.br/

Tango de Xisto Bahia
Gravado por Luís de Oliveira
Acompanhamento de violão
Disco Victor Record 98.799
Lançado em 1909







QUE SORTE, QUE SINA
Modinha de Xisto Bahia
Gravado por Barros (João Barros)
Acompanhamento de Piano e Violão
Disco Odeon Record 40.193, matriz RX-204
Lançado em 1906



  

  
O RIO NÚ (sic)
22 de abril de 1899
http://memoria.bn.br
















Agradecimento ao Arquivo Nirez
  









2 comentários:

  1. Marcelo,
    não me canso de passear por esse blog e tomar uma dose todos os dias. Como pesquisador, sei das dificuldades de encontrar (e reunir) material sobre música brasileira antiga, embora a internet facilitou bastante o processo. Por isso, queria deixar registrado meus sinceros agradecimentos por esse trabalho.
    Por curiosidade, as gravações (do Nirez, suponho) são conseguidas como? Estão disponíveis on-line, como as do IMS?

    Curioso notar que a melodia de "Preta Mina" é a mesma de "A Reforma", gravada bem mais tarde, pelo Dudu das Neves - mas isso era até comum, certo? Só assinalei por curiosidade, já que me veio à cabeça no momento.

    Abraços!

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  2. Gabriel, fico contente com sua visita. Seja sempre bem vindo.
    Eu sou amigo do Nirez. Sempre que preciso de gravações recorro a ele; bem como fotografias. A grande parte das fotos do blog vem do acervo dele.
    Eu vou procurar essa gravação do Dudu das Neves. Naquela época era comum usar a melodia de músicas conhecidas em outros poemas. Isso, inclusive, dá um post interessante. Grande abraço!

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